O processo de investigação aberto pela Arquidiocese de Brasília contra o padre Delson Zacarias dos Santos (foto em destaque), 47 anos, acusado de abuso sexual e estupro de vulnerável, aponta para um desfecho final na esfera religiosa. Na última semana, a apuração avançou e o processo será encaminhado ao Vaticano anexado de uma carta onde o religioso renuncia ao cargo de sacerdote.
A informação foi confirmada à reportagem por uma fonte que acompanha o inquérito aberto pela igreja. A decisão de renúncia é prevista no Código do Direito Canônico, um conjunto de normas que orientam a disciplina eclesiástica, hierarquia administrativa, direitos e deveres dos fiéis, além de possíveis sanções por transgressão de normas para os católicos.
Segundo o documento, qualquer pessoa no uso da razão pode, por justa causa, renunciar ao ofício eclesiástico. “Cân.189 — § 1. Para ser válida, a renúncia, quer necessite de aceitação, quer não, deve ser apresentada, por escrito, ou oralmente perante duas testemunhas, à autoridade competente para prover o ofício de que se trata”, diz um dos artigos.
Segundo apurado pela reportagem, a suspeita é de que pelo menos oito pessoas sofreram com investidas de cunho sexual do religioso. Entre elas, seis já procuraram pela Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), onde a investigação corre em sigilo por envolver menores de idade. Dessa forma, as informações sobre o caso não podem ser divulgadas pela polícia.
Procurada, a Arquidiocese de Brasília, negou que . “Essa informação não procede”, resumiu. O Imprensa também entrou em contato com Delson Zacarias por telefone, mas ele não atendeu as ligações. A reportagem, então, procurou pelo advogado Everton Nobre, defensor do líder religioso em um primeiro momento, mas o profissional informou que deixou o caso. “Não estou mais na defesa do padre Zacarias”, declarou o advogado.
Memória
Delson é alvo desde junho de uma investigação na Polícia Civil, após ser acusado de estupro de vulnerável, supostamente ocorrido entre os anos de 2014 e 2021. As denúncias fizeram a Arquidiocese de Brasília afastar o religioso de suas funções.
De lá para cá, a Imprensa apurou, em primeira mão, a abertura do inquérito contra o sacerdote que acumula passagens por paróquias no Riacho Fundo I, Sobradinho e Lago Sul. Ele também ministrou aulas no seminário de Brasília e na Faculdade de Teologia (Fateo).
A violência sexual praticada contra um dos jovens – que não terá a identidade revelada – iniciou-se quando a vítima tinha apenas 13 anos.
A investida do religioso teria começado na casa paroquial, antes de um casamento, em 2014: “Você se masturba ou assiste pornografia?”, questionou o padre ao então adolescente. O jovem respondeu que não, mas o sacerdote insistiu no assédio.
Na ocasião, o religioso pediu que o jovem se levantasse e abaixasse as calças. O suspeito queria ver o órgão genital do rapaz. “Eu resisti e ele me disse para não ter medo, que ele não faria nada. Nesse momento fiquei assustado, mas confiei. Abaixei as calças e ele tocou no meu pênis”, conta.
Doce de banana
Após a publicação da reportagem uma nova vítima contou os momentos de pânico vividos durante as investidas do pároco. O relato aponta que o religioso usava a desculpa de oferecer “doce de banana” para atrair coroinhas que integravam um grupo do qual ele mantinha proximidade.
De acordo com o servidor público, que atualmente tem 31 anos, o assédio ocorreu quando ele tinha entre 14 e 15 anos, durante o tempo em que frequentava a igreja no Riacho Fundo, pela qual o padre era responsável. A vítima narra que o líder religioso passou a se tornar mais próximo quando ele foi escolhido para ingressar em um grupo chamado Cerimoniários, em que só havia participantes do sexo masculino com idades até 18 anos.
Durante uma noite, em 2004, o padre passou de carro na frente da casa do então adolescente. Ele buzinou e fez o convite. “Minha mãe, que é muito católica e frequentava aquela igreja, avisou que o padre Zacarias estava me chamando. Quando cheguei do lado de fora, ele me falou para entrar que iríamos até a casa dele pegar um doce de banana que ele havia feito para minha mãe”, lembrou.
Chegando à casa do pároco, a atitude dele mudou, segundo a vítima. O religioso o chamou para o quarto e fez uma pergunta direta. “Ele quis saber se eu tinha o costume de me masturbar. Respondi que sim, achando que ele fosse me corrigir. Depois, pediu que eu tirasse a blusa, pois queria ver se eu era magrinho. Em seguida, pediu para ver minhas ‘coxinhas’. Naquele momento, o padre foi além e pediu para que eu tirasse o short”, contou.
O pároco, então, pegou uma câmera digital, afirmando que faria algumas fotos do adolescente. “Ele pediu para que eu ficasse de cueca. Naquele momento, fiquei com o corpo todo tremendo, mas tive a reação de dizer que queria ir embora. Ele, então, me levou de volta, sem dizer uma palavra durante o trajeto até a minha casa”, recordou.
Masturbação dentro da igreja
O relato mais recente conta que um jovem foi masturbado pelo pároco dentro da igreja, no dia do seu aniversário. Em um vídeo cedido à reportagem pela vítima, ela revela que o abuso aconteceu dentro da paróquia São Mateus, em Sobradinho, comunidade que Delson Zacarias comandou entre os anos de 2013 e 2018.
Hoje com 26 anos, ele comemorava o seu aniversário de 18 anos quando foi abusado. “Nesse dia, a gente saiu para comer pizza, tinham outros rapazes com a gente”, relembra. Após a comemoração, o rapaz ficou a sós com o líder religioso. “Ficou combinado de o padre me levar para casa.”
Na ocasião, assim como em relatos anteriores, o sacerdote demonstrou interesse no órgão genital do rapaz. “Ele começou a falar do tamanho do pênis de um dos jovens que estava lá, que parecia ser grande, que dava volume na roupa, essas coisas”, conta. “Perguntou se o meu era como o dele e pediu para ver.”
“Achei muito estranho, fiquei assustado, neguei diversas vezes, mas ele insistiu”, diz. Mesmo com a negativa, o padre prosseguiu e começou a tocá-lo. “Ele colocou a mão no meu pênis e começou a masturbar, querendo ver como ele ficaria duro.”