Primeira investigação já tinha sido arquivada por falta de materialidade. Novo processo ocorre após suposto ‘novo fato de abuso sexual’. Padre afirma que acusações são falsas e têm como objetivo atrapalhar o sentido de seu sacerdócio: ‘a luta pelos desamparados e pelo povo de rua’.
A Arquidiocese de São Paulo afirmou nesta segunda-feira (5) que vai abrir uma nova investigação sobre um “suposto novo fato de abuso sexual” envolvendo o Padre Julio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua de São Paulino
O padre Julio Renato Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua de São Paulo. — Foto: Reprodução/Instagram
Segundo a Arquidiocese, a nova apuração será para “a busca da verdade” sobre as acusações que envolvem o padre, uma vez que o pároco tem sido vítima de uma campanha política difamatória por parte de políticos de direita com a divulgação de vídeos contra o religioso.
Para a entidade, a “notícia de um suposto novo fato de abuso sexual” e a “recente divulgação de laudos periciais com resultados contraditórios” sobre um vídeo com supostas imagens do padre “requerem uma nova investigação da parte da Arquidiocese para a busca da verdade”.
“A norma da Igreja e investigando o caso na área de sua competência, distante de interesses ideológicos e políticos, com serenidade e objetividade”, disse a Arquidiocese de São Paulo
padre Júlio também é alvo de um pedido de CPI na Câmara Municipal de São Paulo, apresentado pelo vereador Rubinho Nunes (União Brasil).
O objeto do pedido de CPI na casa é a atuação de ONGs que atuam na Cracolândia, mas o vereador, que era membro do Movimento Brasil Livre (MBL), direcionou a comissão contra o padre, o que gerou revolta e indignação por parte de vereadores que assinaram o pedido e retiraram apoio à comissão.
O assunto volta a ser debatido entre os vereadores no colégio de líderes dessa terça-feira (6), na Câmara Municipal.
Por meio de nota, o Padre Júlio Lancelotti se disse confiante na nova investigação da Arquidiocese e disse ser alvo de imputações “falsas e inverídicas”.
“Recebo, com serenidade e paz de espírito, a nota da Arquidiocese de São Paulo, publicada na presente data, informando que apura as acusações lançadas nos últimos dias. Esclareço que as imputações surgidas recentemente — assim como aquelas que sobrevieram no passado — são completamente falsas, inverídicas e tenho plena fé que as apurações conduzidas pela Arquidiocese esclarecerão a verdade dos fatos”.
Segundo o religioso, “as acusações estão imbricadas em uma rede de desinformação, que mascara eventuais interesses de setores do poder político e econômico em ceifar aquilo que é o sentido do meu sacerdócio: a luta pelos desamparados e pelo povo de rua”.
“Sigo, de maneira inabalada, a esperança de um futuro que extirpe o ódio aos pobres das nossas ruas e dos nossos corações”, declarou o padre.
Íntegra da nota do Padre Júlio Renato Lancellotti em 05/02/2024. —
Arquivamento anterior
Em 22 de janeiro, a Cúria Metropolitana de São Paulo disse ter recebido do presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (União Brasil), um vídeo com uma suposta denúncia contra o padre Julio Lancellotti, também em um caso de assédio sexual.
ocasião, a Arquidiocese disse que o material era o mesmo conteúdo divulgado em 2020 contra o padre. As imagens já haviam sido apuradas pela Arquidiocese e pelo Ministério Público de São Paulo e não havia “convicção suficiente sobre a materialidade da denúncia”.
Por isso, a Arquidiocese disse ter decidido pelo arquivamento do caso.
Porém, Milton Leite – que é cotado para ser candidato a vice-prefeito na chapa do atual prefeito Ricardo Nunes (MDB) – afirmou que tem novas denúncias contra o pároco e insistiu em levar o novo caso para o Vaticano e o Ministério Público de SP.
A nova investigação deve servir de munição para os adversários do Padre Júlio pressionarem pela abertura da CPI na Câmara Municipal.
Mas as denúncias de suposto abuso sexual contra o padre não tem nenhuma relação com o objeto da comissão protocolada na Câmara para investigar ONGs que fazem serviço social na área da Cracolândia.
Para a oposição, Milton Leite e Rubinho Nunes – ambos do União Brasil – tentam politizar o assunto para colher dividendos políticos na eleição de outubro, uma vez que Júlio Lancellotti é ligado à movimentos sociais que apoiam a candidatura de Guilherme Boulos (PSOL) à Prefeitura de São Paulo e tem relações pessoais com o presidente Lula (PT).
Boulos lidera as pesquisas de intenção de voto para o cargo e é o principal entrave para os planos de reeleição do atual prefeito Ricardo Nunes (MDB).
“O trabalho realizado [pelo Padre Júlio], de defesa dos direitos da população em situação de rua, é respeitado a décadas na região. É uma vergonha que um grupo de vereadores bolsonaristas, na busca por mídia, tente atrapalhar e criminalizar esse trabalho”, disse a vereadora Luana Alves (PSOL).
O presidente Lula (PT) e o padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo de Rua de SP. —
Reafirmei ao Padre Júlio o compromisso da bancada de vereadores do PSOL em não admitir nenhuma perseguição aos defensores dos direitos humanos. Peço pra que todas as pessoas acompanhem essa questão e sigam pressionando a Câmara Municipal para que não tenha criminalização dos que desenvolvem um trabalho sério e necessário junto à população em situação de rua. A desumanização do povo pobre, do povo preto e do povo de rua é o que cria a violência”, completou.
vereador Rubinho Nunes classificou como “máfia da miséria” o trabalho feito por instituições na região da Cracolândia e também negou viés político.
Segundo ele, a CPI visa investigar todas as pessoas físicas ou jurídicas que atuem na região central de São Paulo e que, “por mais que o [padre] Júlio não atue formalmente no quadro de ONGs, há indícios de sua ligação. Isso também pode e será averiguado”.
Já o vereador Senival Moura, líder do PT na Câmara dos vereadores de SP, disse que Rubinho Nunes está “criando um factoide contra uma pessoa honrada e séria como o padre Júlio”.
“O Rubinho Nunes é um fanfarrão. Apesar de bom parlamentar, está jogando para a plateia dele e criando um factoide contra uma pessoa honrada e séria como o padre Júlio. Não existe acordo algum para que essa CPI seja criada. O PT é contra e vai obstruir e fazer o que for pra barrar essa ideia equivocada. É uma perseguição injustificada, com objetivo de ganhar votos extremistas na eleição de outubro em cima de uma pessoa que dedica a vida a ajudar os famintos”, disse Senival Moura
A vereadora Luana Alves (PSOL) e o líder do PT na Câmara, vereador Senival Moura. —