Denúncias do MPF apontaram desvios de mais de R$ 11 milhões em verbas públicas destinadas a contratações para unidades de saúde do estado
A Justiça Federal condenou dez pessoas por desvios de verbas públicas realizados por meio de pagamentos sem comprovação da prestação dos serviços contratados e de pagamentos integrais por produtos e serviços fornecidos parcialmente ou nunca fornecidos a unidades de saúde da capital e do interior do Amazonas. Somados, os desvios chegam ao valor de R$ 11.283.286,28. As cinco sentenças foram proferidas pela Justiça em ações penais movidas pelo Ministério Público Federal (MPF), em decorrência da Operação Maus Caminhos.
Além do médico e empresário Mouhamad Moustafa, foram condenados pelo crime de peculato, previsto no artigo 312 do Código Penal, Priscila Marcolino Coutinho, Jennifer Naiyara Yochabel Rufino Corrêa da Silva, Paulo Roberto Bernardi Galácio, Pablo Gnutzmann Pereira, Gilberto de Souza Aguiar, Pauline Azevedo Sá Campos, Paulo César Almeida de Souza, Rossycleia de Jesus Pinto da Silva e Aila Maria Lopes de Souza.
Pagamentos sem notas fiscais – Duas das cinco denúncias do MPF, que acarretaram nas condenações dos réus pela Justiça, indicam o desvio de verbas públicas, concretizados por pagamentos realizados pelo Instituto Novos Caminhos (INC) a empresas contratadas sem nenhuma comprovação de contraprestação em serviços ao instituto.
Em uma delas, o MPF apontou que, entre maio e julho de 2014, os réus desviaram R$ 4.701.886,30, por meio de 17 pagamentos efetuados pelo INC à empresa Total Saúde Serviços Médicos e Enfermagem, sem a emissão de notas fiscais que atestassem a prestação dos serviços pagos. Nesse processo, foram condenados Mouhamad Moustafa, gestor de fato do INC e procurador com amplos poderes de gestão da Total Saúde, Priscila Coutinho, responsável pela gestão financeira do INC, e consequentemente, pelos pagamentos destinados às empresas contratadas, Jennifer da Silva, sócia e representante legal da Total Saúde e Paulo Roberto Galácio, presidente do INC no período que ocorreram os desvios, e responsável pela fiscalização dos contratos e prestação de contas.
Outra denúncia do MPF indicou o desvio de R$ 2.113.946,43 realizado pelos réus por meio de 26 pagamentos efetuados pelo INC à empresa Medimagem, novamente sem a emissão de notas fiscais, entre maio e outubro de 2014. Além de Mouhamad, Priscila e Paulo Roberto, o proprietário da Medimagem, Gilberto Aguiar, também foi condenado neste processo.
Pagamentos por produtos e serviços não fornecidos – Outras duas denúncias do MPF que resultaram em sentenças condenatórias aos réus apontaram desvios de recursos públicos concretizados por pagamentos efetuados pelo INC à empresa Salvare por produtos e serviços nunca fornecidos.
Em uma das ações penais, o MPF apontou o desvio de R$ 153.633,37, por meio de 11 pagamentos do INC à Salvare referentes ao aluguel de equipamentos hospitalares que nunca foram fornecidos pela empresa à Unidade de Pronto Atendimento 24 horas e Maternidade Enfermeira Celina Villacrez Ruiz (UPA Tabatinga), entre 2015 e 2016. Neste processo, foram condenados Mouhamad, Priscila, Jennifer – que era presidente do INC à época – e a diretora da UPA Tabatinga, Pauline Campos, que atestou as notas fiscais mesmo sabendo que equipamentos eram disponibilizados em menor quantidade do que o especificado em contrato.
Outra denúncia apresentada pelo MPF indicou que os réus desviaram R$ 1.521.380,18 por meio de 16 pagamentos feitos pelo INC novamente à Salvare, entre 2014 e 2016, relativos ao fornecimento de tecnologia e material de apoio para instalação e manutenção de um sistema de software hospitalar para o Centro de Reabilitação em Dependência Química (CRDQ) Ismael Abdel Aziz, que nunca chegou a funcionar. Mouhamad, Priscila, Jennifer, o diretor executivo do CRDQ, Pablo Pereira, e os gerentes administrativos do centro de reabilitação, Paulo César de Souza e Rossycleia da Silva, foram condenados neste processo.
Pagamentos por serviços parcialmente fornecidos – Em outra ação penal, o MPF apontou o desvio de R$ 2.792.440,00 em verbas públicas, concretizados por pagamentos do INC à empresa Salvare referentes a serviços de plantão assistencial contratados para o CRDQ, entre novembro de 2014 e maio de 2015.
O trabalho de fiscalização feito pela Controladoria-Geral da União (CGU), constatou que a quantidade de profissionais e de plantões prestados no CRDQ era expressivamente menor que o previsto em contrato. Apesar da prestação de serviço nunca ter sido integral, o INC sempre pagou à empresa pelo valor total dos serviços contratados. Além de Mouhamad, Priscila, Jennifer e Pablo Pereira, a gerente administrativa do CRDQ, Aila Maria de Souza, também foi condenada neste processo.
Somadas as penas das cinco sentenças, Mouhamad Moustafa foi condenado pela Justiça a 49 anos, 4 meses e 15 dias de prisão em regime fechado e ao pagamento de multa de mais de R$ 6,9 milhões. Também presente nas cinco ações penais, Priscila Coutinho foi condenada ao todo a 35 anos, 7 meses e 15 dias de prisão em regime fechado domiciliar, conforme previsto em seu acordo de colaboração premiada, e ao pagamento de mais de R$ 780 mil em multas.
Condenada em quatro ações, Jennifer da Silva teve as penas definidas pela Justiça em um total de 7 anos, 6 meses e 10 dias de prisão em regime fechado e deverá pagar multas que somam mais de R$ 135 mil.
Presente em duas ações penais, Paulo Roberto Galácio foi condenado a um total de 11 anos e 15 dias de prisão em regime fechado e ao pagamento de mais de R$ 190 mil em multas. Também alvo de duas ações, Pablo Pereira foi condenado a um total de 8 anos, 10 meses e 12 dias de prisão em regime fechado e ao pagamento de multa de mais de R$ 100 mil.
Todos alvos em uma das cinco ações penais, Gilberto Aguiar foi condenado a 4 anos e 22 dias de prisão em regime fechado e ao pagamento de multa de mais R$ 90 mil; Pauline Campos a 4 anos e 2 meses de prisão em regime fechado e ao pagamento de multa de mais de R$ 78 mil; Paulo Cesar de Souza a 3 anos de prisão em regime aberto e ao pagamento de multa de mais de R$ 16 mil; Rossycleia da Silva a 3 anos, 1 mês e 15 dias de prisão em regime aberto e ao pagamento de multa de mais de R$ 14 mil; e Aila Maria de Souza a 3 anos e 6 meses de prisão em regime aberto e ao pagamento de multa de mais de R$ 28 mil.
As ações penais seguem tramitando na 4ª Vara Federal no Amazonas, sob os números 6979-20.2017.4.01.3200, 9518-56.2017.4.01.3200, 8153-64.2017.4.01.3200, 6361-75.2017.4.01.3200 e 7571-64.2017.4.01.3200. Cabem recursos de todas as sentenças.
Operação Maus Caminhos – Em 2016, a Operação Maus Caminhos desarticulou um grupo que desviava recursos públicos por meio de contratos firmados com o governo do estado para a gestão de três unidades de saúde em Manaus, Rio Preto da Eva e Tabatinga, feita pelo Instituto Novos Caminhos (INC), instituição qualificada como organização social.
As investigações que deram origem à operação demonstraram que, dos quase R$ 900 milhões repassados, entre 2014 e 2015, pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS) ao Fundo Estadual de Saúde (FES), mais de R$ 250 milhões teriam sido destinados ao INC. A apuração indicou o desvio de recursos públicos, além de pagamentos a fornecedores sem contraprestação ou por serviços e produtos superfaturados, movimentação de grande volume de recursos via saques em espécie e lavagem de dinheiro pelos líderes da organização criminosa.
As operações Custo Político, Estado de Emergência, Cashback, Vertex e Eminência Parda, desdobramentos da Operação Maus Caminhos, mostraram, ainda, o envolvimento de agentes públicos integrantes da alta administração do estado do Amazonas que, em conluio com agentes privados, contribuíram para o desvio de recursos federais destinados ao financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS).
Íntegras das sentenças, relacionadas aos respectivos processos: