O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, disse ontem (23) que seu país tem responsabilidade sobre crimes da era colonial. Entre eles, tráfico de escravos na África, massacres a indígenas brasileiros e bens saqueados. É a primeira vez que um representante do Estado de Portugal assume os crimes do passado. Contudo, movimentos sociais cobram ações concretas de reparação. Então, Brasil e Portugal já começam articulações neste sentido.
“Temos que pagar os custos (pela escravidão). Há ações que não foram punidas e os responsáveis não foram presos? Há bens que foram saqueados e não foram devolvidos? Vamos ver como podemos reparar isso”, disse o presidente. “Portugal assume total responsabilidade pelos danos causados”, completou. A fala de Rebelo de Sousa aconteceu durante a noite, em uma roda de conversas com jornalistas estrangeiros que trabalham em Portugal.
Embora tenha dito claramente sobre reparação, ele não deu detalhes. A responsabilidade de Portugal sobre a escravidão é clara. O Império Português colonizou grande parte da África, além de manter o Brasil, na América do Sul, e colônias na Ásia e Oceania. O grande motor econômico das Grandes Navegações e da expansão do império foi a escravidão. Praticamente a metade de todos africanos escravizados tinham como destino terras portuguesas. Foram mais de 6 milhões de pessoas.
Oposição em Portugal
Enquanto o governo português pensa em mitigar os danos de séculos de escravidão, a oposição de extrema direita no país tenta impedir. O partido Chega, formado de radicais ligados ideologicamente ao bolsonarismo no Brasil, repudiou a fala do presidente. “Vergonha! Se houvesse forma de destituir o Presidente da República Portuguesa neste momento, o Chega fá-lo-ia!”, afirmou a representação extremista em suas redes sociais.
Ações concretas
A fala de Rabelo de Sousa repercutiu no Brasil. O governo Lula, desde seus primeiros mandatos, deixa clara a intenção de reparar os danos sobre a escravidão. Lula já falou abertamente sobre isso em diferentes ocasiões, inclusive em inúmeras visitas a países africanos. Então, a postura do presidente português foi bem recebida.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, disse que o governo já entrou em contato com autoridades de Portugal. A ideia é debater formas concretas de reparação. “Pela primeira vez estamos fazendo um debate desta dimensão em nível internacional. É algo realmente importante e contundente”, disse a ministra.
Anielle destacou ainda que a manifestação é reflexo de “séculos de cobrança da população negra”. “Muitas organizações do movimento negro cobram uma posição mais firme de Portugal, justamente sobre esse tema. A fala deve vir seguida de ações concretas. Nossa equipe já está em contato para dialogar e pensar essas ações e passos”, disse.