Vírus levou matriarca de 95 anos, 5 de seus 22 filhos, uma neta e um genro.
Oito sepultamentos por Covid-19 de pessoas da mesma família foram vivenciados pela vendedora Rebeca Paulain Almada, 23, de Parintins, cerca de 369 km de distância de Manaus. O pai, a avó, cinco tios e uma prima.
A família Almada perdeu sua matriarca, Jandira, 95, 5 dos 22 filhos que ela teve (Heloisa, 79, Heider Augusto, 76, Eduardo Jorge, 67, Gilberto, 61, e Zomar, 56), a neta e o genro de Jandira, Tereza Cristina, 40, e Eduardo Gomes, 57.
No dia 22 de junho do ano passado, morreu Tereza Cristina. A primeira perda ficou deslocada da série que viria em 2021.
Ela tinha apenas 40 anos e chegou a relatar na rede social o drama antes de morrer. “Pra complicar, pneumonia viral moderada e um agravante, tenho lúpus”.
Em janeiro deste ano, enquanto muitos parintinenses se aglomeravam nas ruas, Rebeca se via entre o hospital Jofre Cohen, o cemitério municipal São José e a transferência dos parentes graves para Manaus. “Eu não sabia o que fazer. Via o vale da sombra da morte na nossa casa.”
Parintins é uma das cidades mais atingidas pela Covid-19 no Amazonas, com 9.112 casos e 312 mortos, segundo dados da prefeitura desta segunda-feira (29).
No dia 8 de janeiro, morreu Heloísa, no auge do contágio após o surgimento da variante P1. Uma semana depois a família perdeu Heider, em casa, onde montaram uma enfermaria. “Acabou o oxigênio, nós não conseguimos repor a tempo”, relembra Rebeca.
Três filhos de Jandira e o cunhado morreram antes de sua partida, no dia 21 de fevereiro.
Jandira havia criado 22 filhos em Parintins. A notícia da morte da filha Heloísa a estremeceu.
Mortes sem despedida. “Minha avó era forte. Mas quando a tia Heloísa morreu, ficou arrasada e disse que não suportaria mais viver. Foi quando decidimos não contar mais nada.”
Os domingos, os feriados e os aniversários da família Almada não deixavam dúvidas. Aqueles irmãos eram carne, unha e coração. As reuniões em família, as fotos, o violão sobre a perna, a cadeira de balanço, a rede. Tudo lembrava amor, união e felicidade.
As filas de ambulâncias e de cortejos no Amazonas evidenciavam o colapso. “Meu pai adoeceu cuidando do meu tio Zomar”, aponta Rebeca.
A luta de Rebeca, então, passou a ser a de salvar o tio Eduardo Jorge e o pai, Gilberto. No dia 2 de março, já exausta, Rebeca perdeu o quinto tio. Morre Eduardo. Restava se agarrar às últimas forças pelo pai.
O professor Gilberto, aos 61, intubado por complicações da Covid-19, sofreu um AVC no dia 14 e infelizmente tornou-se a oitava vítima da família. “Recebi a ligação me chamando ao hospital. Meu pai queria muito viver, ele lutou muito, mas havia pouco a ser feito. Quando eu vi os exames, eu sabia”.
Restou a saudade e um recado de Rebeca sobre o sofrimento na pandemia. “A minha família acabou se contaminando porque alguém não se cuidou. Evitamos aglomerações, fizemos de tudo. Essas pessoas que andam sem máscaras, vão aos bares abertos, elas carregam um pouco de culpa. Dá uma revolta na gente. Será que essas oito mortes foram em vão?”