A atriz Isabel Teixeira, intérprete de Maria Bruaca em Pantanal, festeja o êxito global, mas reconhece que não foi fácil: ‘Eu fiz a minha estrada, minha coerência e, às vezes, paguei um preço alto por isso’
Com mais de 38 anos de teatro, a atriz Isabel Teixeira (48) já teve seu trabalho reconhecido no Brasil e até fora do País, mas só agora sente tudo isso tomar uma proporção maior. Em sua segunda novela, a paulistana rouba a cena em Pantanal como Maria Bruaca. A personagem descobre que o marido tem outra família e dá o troco. O drama do papel e a possibilidade de fazer TV inspiram a artista e lhe provocam reflexões. “É como se eu tivesse 20 anos de novo”, diz. Filha do cantor Renato Teixeira (77) e da atriz Alexandra Correa, irmã do cantor Chico Teixeira (42), e mãe de Diego (18) e Flora (11), ela garante continuar a mesma, apesar de estar vivendo uma fase intensa de descobertas pessoais e profissionais.
– Sua vida mudou?
– Não muito e acho que não vai mudar. Eu trabalho no que eu gosto, então não está muito diferente. As redes sociais, de que eu nem era muito adepta, eu estou aprendendo a lidar. Mas é muito forte o que vem acontecendo. Na rua, eu não sou muito reconhecida ainda. Eu sou paulistana, gosto de andar no centro da cidade, de ir ao Minhocão, de ir para o Copan. Sou urbana mesmo, amo a minha cidade. Meu pai falava assim: “Eu quero ver quando você voltar do Pantanal, todo mundo vai te parar na rua”. Ninguém me parou.
– Mas isso é uma frustração?
– Não, isso é muito bom. E quando param, eu adoro bater papo também. É muito legal alguém vir feliz por me encontrar.
– Está gostando de fazer TV?
– Eu estou apaixonada por essa novidade. Esse grande alcance da TV, junto com uma nova técnica, está me fazendo sentir como se eu tivesse 20 anos de novo. São os desafios que fazem a gente ficar vivo. Todo trabalho que fiz sempre teve um desafio, como morar fora, fazer uma peça em francês e agora isso. O que está me acontecendo é único e veio agora porque tinha que ser agora, senão, não estaria tão gostoso.
– Por que demorou tanto?
– Pra mim não demorou. Meu pai falava que tudo tem seu tempo. Pra mim o tempo passa rápido também. Meu filho nasceu outro dia, está com 18 anos, indo embora de casa. Para eu elaborar e aceitar isso, precisei de um choque!
– Foi falta de oportunidade?
– Quando me formei na Escola de Arte Dramática, fui fazendo uma peça atrás da outra. Eu vivi de teatro todos esses anos, sendo que sou arrimo de família. Eu estava sempre com quatro, cinco empregos. Eu dirijo, escrevo, atuo, dou aula. Então acho que, pra mim, não veio tarde, veio na hora que tinha que vir. Eu sempre senti como se a minha vida estivesse começando com 20 anos, com 30, com 40 e agora com 50. E ainda tem tanta coisa pra fazer… É tão legal estar vivo!
– Por que acha que a Bruaca mexe tanto com o público?
– Eu tenho várias teorias, mas acho que tem uma coisa de torcida pra ela mudar. Quando a gente está numa situação e sabe que não está bom, é tão difícil mudar… Dar o primeiro passo da mudança requer muita coragem ou um empurrão, como foi o que aconteceu com a Maria Bruaca. Porque aquela descoberta que o Tenório (Murilo Benício) tinha outra família foi um empurrão. É tão fácil ver o outro, mas é difícil ver a nós mesmos, porque a gente tem que se conhecer muito. É um autoconhecimento que a gente precisa ter e parar de viver em relação à outra pessoa. Teve uma torcida grande para ela botar um cropped e reagir. Eu acho que o País se identifica com a personagem, quer mudança e não sabe ao certo como fazer isso. Estou falando muito no geral, porque claro que tem o reconhecimento do abuso. Então, tem essa identificação do tipo: “Chega! É hora de a gente nomear e falar não!”.
– Existem muitas Bruacas?
– O Brasil é muito grande, com pessoas inteligentes, bem-humoradas, batalhadoras. Só que a gente ainda tem muita coisa arraigada. Eu acho que tem muitas Bruacas ainda, porque nós, como povo, também temos que reagir. Mas não é assim tão rápido. Imagina onde a Bruaca mora, por exemplo, é uma coisa difícil, porque ela não tem acesso ao rádio, televisão ou internet. Como é que a pessoa vai ter referência para saber que ela está sofrendo um determinado tipo de abuso? Tem lugares no Brasil em que a cultura não chega, a educação de base é antiga e a gente ainda não tem parâmetros para saber que a gente pode viver de um outro jeito.
– Até quem tem acesso demora a perceber algumas situações…
– Isso é muito difícil. Eu nasci na década de 1970, tive a minha adolescência e juventude na década de 1990 e estou trabalhando isso ainda. Tem uma nova geração aí que veio com questões que puxam a gente muito pra frente. A questão do gênero eu acho avançadíssima num País que também dá muitos passos pra trás. Eu achava, na minha adolescência, que tinha coisas que eram normais e hoje vejo que não são.
– O que interpretar a Maria Bruaca tem te ensinado?
– Isso. Eu estou no meu tempo, em movimento e estou adorando. Hoje eu estava saindo do estúdio, depois das gravações, e pensei assim: “Eu vou voltar para o hotel, vou dar umas entrevistas, eu sou mãe, sou mulher, eu trabalho e eu não preciso estar em uma relação com ninguém”. Isso é uma coisa totalmente da Bruaca. O importante pra ela é estar casada custe o que custar. E fiquei pensando nesse sentimento quase de completude, de que está tudo bem. Na minha família tem mulheres que decidiram não ter filhos e não se casar e tiveram que batalhar por isso, porque rola muito preconceito. “Ela ficou pra tia.” Isso é do nosso imaginário cultural. Não! Ela escolheu não ter filhos, ela escolheu fazer outros tipos de parentesco, ela escolheu namorar homens, namorar mulheres, escolheu ser mulher, ser homem, mas ela também escolheu ficar sozinha e ela é feliz assim! Eu fiz a minha estrada, minha coerência e, às vezes, paguei um preço alto por isso. E ser assim, e ser reconhecida por isso, é maravilhoso.
Fonte: Revista Caras
Foto: Divulgação